ALDO CALVET

 

SBAT Sociedade Brasileira de autores

TEATRAIS


discurso recepcionando

Maria Clara Machado

Senhor Presidente

Senhores Conselheiros

Meus Consócios


Falar sobre Maria Clara Machado nesta Casa de autores e homens de teatro, só mesmo como pretexto para exaltar mais uma vez o valor reconhecido e por todos admirado.

        

Companheiros eu conheci Maria Clara por necessidade de trabalho. Nosso primeiro contato aconteceu quando eu, Diretor do SNT, interessado em definir e completar o currículo do então Curso Prático de Teatro, privado da magnífica colaboração do ator-professor Sady Cabral, que se afastava por interesses profissionais vantajosos na cidade de São Paulo, não podia eu deixar ao abandono uma matéria curricular tão importante e em evidência nos mais adiantados centros culturais do mundo e no Brasil em execução ainda de modo empírico. Maria Clara Machado, que havia feito um curso na França exatamente da disciplina em aberto, era a substituta ideal por excelência.


Esclareço: a matéria em referência era Improvisação. Na época o estudo da Improvisação era nada conhecido e pouco aplicado nos nossos três únicos estabelecimentos de aprendizado teatral. A princípio, - não só aqui no Brasil – houve certa confusão entre o método da Improvisação e o estilo de interpretação da Commedia dell’Arte. Mesmo na França, na Itália e na Inglaterra, o empirismo confundia a nova proposta didática de Charles Dullin com a espécie da representação dos tempos passados, entendendo alguns que se tratava de simples renovação, sob forma moderna da usança típica dos comediantes italianos do século XVII. O que Dullin desejava e Maria Clara estava capacitada a transmitir aos estudantes do Curso Prático de Teatro com toda a eficiência era precisamente como ele mesmo dizia – a aplicação de “um método vivo para ensinar a teoria e a prática da interpretação dramática e ajudar o desenvolvimento da personalidade de cada aluno”. Dullin acreditava que o ensino do teatro se baseava de maneira geral sobre o mimetismo, por isso que o estudante dramático imitava o professor ou os atores famosos de sua simpatia e assim se afundava no artificialismo e no convencional”. O mestre francês afirmava com toda convicção que “A improvisação obriga o discípulo a descobrir seus próprios meios de expressão.” Maria Clara, posso assegurar, - exerceu com proficiência e talvez sem competição a cátedra desta disciplina dificílima pela exigência de uma técnica esmerada de exercitação sensitiva na aplicação coexistente do teórico e o prático. Por exemplo: como “sentir” antes de intentar expressar; “olhar” e “ver”, antes de descrever o que viu; “escutar” e “ouvir” antes de contestar a um interlocutor; outros exemplos que devem ser apresentados pelo professor – contemplar uma paisagem, seguir o vôo de um pássaro no espaço etc. etc. e assim numerosos outros exercícios considerados indispensáveis aos estudantes da arte interpretativa.


A dedicação de Maria Clara é outro aspecto das virtualidades da sua formação educacional e do seu comportamento de didata. O devotamento de Maria Clara pela Escola não se limitava aos períodos de aula como mestra. De certa feita, estando de férias, me escreve de Paris, lembrando a conveniência de nossos esforços no sentido de trazermos ao Brasil o professor Etienne Decroux, com o qual aproveitava o tempo de folga para fazer um curso de mímica. E dizia textualmente: “Precisamos levar o professor Decroux para nossa Escola. É um grande Mestre”.


Espírito arejado, inteligente, estudiosa, culta, Maria Clara teve oportunidade de cultivar todos esses dons durante a infância e a adolescência no convívio de poetas e artistas em tertúlias de que seu ilustre pai, nosso saudoso Aníbal Machado, contista de raça, também participava naquela casa bucólica da Visconde de Pirajá dos tempos de Ipanema grande areal, do bonde elétrico mão-dupla. Nome consagrado no meio artístico e cultural do país como professora de arte dramática, como autora de numerosos textos de teatro infantil, hoje, sem dúvida, a maior expressão dessa especialidade, aqui e além-fronteiras, atriz de pleno domínio cênico, diretora de grande força de imaginação e de técnica aprimorada no labor cotidiano do palco, fundadora e criadora de grupos, instituições, escolas, certo que com todo esse cabedal de realizações marcantes, Maria Clara Machado estava há muito fazendo falta ao Conselho da SBAT, no qual, diga-se de passagem, se não conseguimos in-totum, procuramos sempre reunir as expressões mais legítima da dramaturgia nacional de todos os tempos.


Rio, 08.03.83                                                       

Aldo Calvet

Conselheiro-Diretor da SBAT