ALDO CALVET

 

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TROTTOIR...TROTTOIR...

TROTTOIR...



  1. 1986

  2. Foi proibida pela Censura em 1969


Gênero:

  1. comédia dramática – 3 atos

Dedico:

  1. esta peça a Helen Buckingham – líder das prostitutas inglesas. Homenagem à sua luta contra a Lei das Ofensas Públicas (Street Offences Act).


  2. “No tener los vícios de su epoca es estar fuera de su epoca e contra su epoca” – Vargas Vila.



Algumas palavras

do Autor:

  1. Esta peça é original. Não existe nela nenhuma semelhança. Não existe nela a decantada “mera coincidência”. Resulta trabalho de pura imaginação. De criatividade. Pois, claro, que todos logo dirão que nenhuma prostituta fala como MAVI. Nenhuma prostituta tem essa cultura, essa erudição, esse linguajar, enfim. Pois se tivesse essa cultura, essa erudição, esse linguajar, num pais de 60% de analfabetos, com alguma vantagem de muitos que aí estão, ela poderia ate ocupar o cargo de Ministro de Estado. Porque não se trata de fiel retrato da realística social brasileira é que devemos entender “Trottoir…Trottoir…Trottoir…” como um reflexo da doutrina de libertação da criatura humana.


  2. Outras vezes, tenho tentado a mesma temática. Lembro, por exemplo, em “Katalina”, de 1938, dei o primeiro passo nesse sistema filosófico que sustenta que o indivíduo é dono de si e de si faz o que bem entende, respeitado o direito de outrem. Pois bem, “Katalina”, lida por Agripino Grieco, foi considerada bela e o nome do então debutante dramaturgo recebeu do eminente crítico o vaticínio de “destinado a ligar-se ao que de melhor produzirá nosso teatro de amanhã”. Já Viriato Correia, talvez por ironia, confessou que não entendera “Katalina”, porque era peça filosófica. O acadêmico estava certo. Se, de fato, Viriato Correia compreendeu ou deixou de compreender a peca, pouco importa, porque o importante é mesmo reafirmar que “Katalina” é realmente filosófica. Nela elaboro a filosofia da libertação do homem. Em “Trottoir…”, pela segunda vez, tomo como símbolo a figura de uma simples prostituta. Ela deve dispor do seu corpo e dele fazer o que melhor entender: dar, vender, alugar, princípio que explode atualmente em nossa sociedade de consumo com a doação de órgãos tais como rins, olhos, líquido seminal ou esperma, sangue humano ou o aluguel de útero para inseminação. Pretendo, em “Trottoir…”, exatamente a filosofia da integração do homem, dono de si mesmo, consciente, independente, liberto de preconceitos, de peias, quer no plano moral, quer no plano científico, político e religioso, deste modo, ser humano sem mutilações dos anseios psicofísicos, ser humano soberbo, grandioso, sublime. Vemos, pois Mavi romper com o maior tabu que é o incesto, repelido pela Igreja como pecado e considerado pela ciência, antes ou depois do mendelismo, como fator de  consequências biotipológicas graves imprevisíveis.


PERSONAGENS:

  1. MAVI – a prostituta da Idade Científica

  2. MARTINIANO – o freguês rico e excêntrico

  3. MADAME NENA – a cafetina próspera e decadente

  4. NARRADOR


  5. Simples rotunda de pano de fundo.


Disposições cênicas:


  1. 2 planos: o 1º Plano vai do proscênio aos primeiros reguladores com entradas e saídas a D. e E. – o 2º Plano começa dos primeiros reguladores para trás. À D., sobre tablado, com cabeceira da direita para a esquerda, uma cama velha de mau gosto, com mesinhas laterais, uma cadeira empoeirada. À E., pequena sala de estar. Uma porta com um reposteiro ordinário. Diante dele, pendente do teto, uma lâmpada elétrica.

  2. No desenrolar da peça, projeções de filmes ilustram algumas cenas.


MOVIMENTO:

  1. Ao início do espetáculo, o 1º Plano se ilumina todo de uma luz opaca. Este efeito é permanente sempre que esteja em ação o plano em referência acima. Trata-se de atmosfera constante, pois não significa simples espaço físico local, rua, beco, beira de calçada, qualquer logradouro, mas espaço psicofísico, isto é, o da alma das prostitutas, no labor cotidiano do ofício, espaço construído em função do comportamento e da reflexão. As prostitutas trabalham sob um clima de tirania. Só por isso se envergonham da profissão.


  2. 1º Ato –

  3. A prostituta Mavi é bela, inteligente e liberta de preconceitos. Após o Narrador fazer sua apresentação, ela expõe facetas de sua personalidade, de sua cultura e de sua vida, desde quando foi abandonada por sua mãe na casa do padrinho – Frei Lourenço de Santa Rita Terence. No seu “trottoir” diário vem percebendo aquele homem que a observa há vários dias – Martiniano – até que ele se aproxima e, num diálogo, se dão a conhecer: ele, rico e rude.


  4. 2º Ato –

  5. Já no quarto do bordel de Madame Nena, enquanto Mavi sai para ir ao banheiro, Martiniano, observando o ambiente, vê a bolsa que ela deixou sobre a mesinha de cabeceira. Curioso, abre-a, tirando uma Carteira Profissional na qual lê os dados de identificação de sua portadora: - Helena Clausbel Martinho – filha de Mariano Clausbel Martinho. Vê, estarrecido, que Mavi é sua irmã por parte de pai. Voltando ao quarto, Mavi percebe a mudança de atitudes em Martiniano. Ele expõe sua descoberta, iniciando-se uma discussão conflituosa entre os dois – Mavi tentando convencê-lo, com sua perspicácia e cultura, que incesto não é pecado. Martiniano, atordoado, prefere embriagar-se (sobre a mesa vê-se duas garrafas de uísque).


  6. 3º Ato –

  7. Mavi e Madame Nena conversam na sala, enquanto, no quarto, Martiniano dorme. Nesse diálogo, elas refletem reminiscências e opiniões com bom humor ou amargura quando Madame Nena também fala de sua vida passada de prostituta. Ao mesmo tempo, ela demonstra estar preocupada com o longo tempo de ocupação do quarto, no que Mavi a tranquiliza pelo pagamento extra. Após ligeira interferência do Narrador, a peça termina com Martiniano monologando em uma espécie de transe onírico, Mavi se aproxima e o acaricia.


Obs:

  1. Esta peca foi proibida pela Censura em 1969.

  2. Em 24.03.2003 – leitura pública no Lounge do Rio Design Center, Leblon – Projeto “Tudo é Teatro” da atriz Giulia Gam – com a participação dos atores Telma Reston, Guta Strasser, Du Moscovis e Alexandre Moreno.

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